19/12/2023 - Plamurb
Por Thiago Silva
Trólebus circulando pela Rua Augusta
Foto Jorge Françozo de Moraes
O processo de desativação parcial do sistema trólebus paulistano teve início no ano de 2002, quando as linhas da zona norte que passavam por Santana tiveram seus veículos elétricos substituídos por ônibus a diesel. Porém, infelizmente, esse retrocesso continuou por outras regiões da cidade, passando pelo corredor 9 de Julho e pela Rua Augusta, foco deste texto.
Partindo do contexto histórico, a Rua Augusta passou a receber os trólebus ainda nos anos 50, quando foram inauguradas as linhas que iam para o Jardim Europa e Jardim Paulistano. Com o passar dos anos, essas linhas foram sendo prolongadas e unificadas a outras linhas, criando o que conhecemos hoje como linhas diametrais.
Rede de trólebus nos anos 50
Foto Movimento Respira São Paulo
Por ser uma região de grande procura, tanto no lado centro, quanto no lado bairro, as linhas da Rua Augusta tinham uma boa demanda, o que se traduzia na necessidade de uma frota grande para que os passageiros fossem agraciados com intervalos menores.
No final dos anos 90, no trecho entre a Rua Caio Prado e a Rua Colômbia, circulavam cinco linhas de trólebus: a 107P (Mandaqui – Pinheiros), a 107T (Tucuruvi – Cidade Universitária), a 702P (Pinheiros – Belém), a 307U (Tatuapé – Butantã USP) e a 207U (Terminal Aricanduva – Butantã USP).
No começo dos anos 2000, com as alterações operacionais, as linhas 307U e 207U foram seccionadas no Terminal Parque Dom Pedro II. O “trecho oeste” da 307U deu origem a uma nova linha, denominada 7110 – Butantã USP/Terminal Parque Dom Pedro II. As demais linhas permaneceram iguais.
A partir de 2002, as empresas Transbraçal e Eletrobus deram lugar às novas empresas Expandir e Trólebus Aricanduva/SPBus. Com a decisão da gestão Marta Suplicy (PT) em desativar o sistema trólebus, em agosto do mesmo ano, as linhas da zona norte deram adeus a esse tipo de veículo. A frota dessas linhas foi usada para reforçar e criar outras linhas.
Em 2003, as linhas de trólebus que rodavam pela Rua Augusta eram a 702P/10, agora indo até o Terminal Penha, a 702P/21, ligando Pinheiros ao Terminal Parque Dom Pedro II, a 702P/41, que atendia ao Belém, mas circulava apenas nos horários de pico, a 7110, e a recém-criada 307P – Terminal Vila Carrão /Pinheiros. Parecia que o sistema ficaria com essa configuração. Parecia…
Os túneis da Faria Lima
Em 2003, a gestão Marta Suplicy decidiu levar adiante o projeto de construção de dois túneis sob a Avenida Brigadeiro Faria Lima, pelo eixo da Avenida Rebouças e da Avenida Cidade Jardim. Os trólebus circulavam tanto na Avenida Faria Lima, quanto na Avenida Cidade Jardim. O sinal de alerta se acendeu. Entretanto, em um primeiro momento, os veículos elétricos deixariam de rodar apenas enquanto as obras dos túneis estivessem em curso.
No dia 19 de dezembro de 2003, os trólebus circulavam pela última vez na Rua Augusta. Com o início das obras, os trólebus foram retirados, e no lugar, passaram a rodar veículos movidos a diesel já no dia seguinte, 20 de dezembro. Ao passar pela região foi constatado que a rede elétrica fora removida apenas no cruzamento das vias em questão. Havia a esperança que os trólebus retornassem.
Em reportagens da época, a prefeitura afirmava que os trólebus dificilmente retornariam, já que a diretriz era buscar novas tecnologias. Pressão dos empresários também contribuíram com essa decisão.
As linhas 107P e 107T já estavam sob operação da empresa Sambaíba com veículos a diesel. As demais linhas de trólebus, continuaram com a empresa Expandir. A linha que ia para o Butantã também passou pera esta empresa, mudando de numeração, passando a ser a 702P/42. A 307P foi desativada.
No ano seguinte, a prefeitura iniciou o processo de remoção da rede aérea das linhas desativadas. Todo o cabeamento aéreo da Rua Augusta e demais vias que se interligavam a ela foram arrancados em meados daquele ano. Os trólebus foram retirados definitivamente.
Das linhas que circulavam pela Rua Augusta, apenas três delas operam nos dias atuais. A 107T deixou de ir até a Cidade Universitária e hoje para no Terminal Pinheiros. A 702P/21 teve sua numeração alterada para 930P. A 7110, que depois virou 702P/42, hoje é a 908T.
Corredor 9 de Julho
Antes da desativação dos trólebus da Rua Augusta, os trólebus que circulavam pelo Corredor 9 de Julho/Santo Amaro também desativados. O fato ocorreu três meses antes, em setembro. Com a reforma do corredor, a prefeitura optou por desativar em vez de readequar, uma atitude bem preguiçosa da gestão Marta e de seu secretário de Transportes, Jilmar Tatto.
Nesse caso, porém, a desativação se deu de forma bem atrapalhada. Há relatos de que a rede elétrica foi desligada em meio a operação dos trólebus. Diversos veículos ficaram parados no meio da rua, gerando congestionamentos e negativando a imagem dos veículos perante às pessoas.
Trólebus que atendia ao Corredor 9 de Julho
Foto Museu Virtual SPTrans/Jorge Françozo de Moraes
O mais curioso é que antes disso, a rede elétrica passou por uma boa modernização, com a implantação dos segmentos flexíveis, que permitiu maior velocidade e flexibilidade operacional.
Mais uma vez faltou boa vontade por parte da prefeitura em manter os veículos elétricos em circulação. Bastaria deslocar a rede aérea de alimentação em cerca de três ou quatros metros em direção ao canteiro central e adaptar portas às esquerdas nos trólebus. Coisas completamente simples e que demandariam pouco dinheiro.
Dias atuais e futuro
Como dito mais acima, na Rua Augusta, hoje circulam as linhas que vão para Pinheiros e Butantã, mas por meio de veículos movidos à diesel. Pensar no retorno dos trólebus nessa via pode parecer uma utopia nos dias atuais, principalmente se levarmos em conta a atual diretriz da prefeitura em apostar nos ônibus a bateria.
Porém, em um cenário de reorganização e priorização do transporte público, mesmo sendo recomendado que os trólebus circulem em corredores, poderia haver espaço para eles na Rua Augusta. Políticas de mobilidade estão aí para isso, mas essa é uma outra discussão.
Para finalizar, fica aqui a lembrança dessa fatídica data, onde uma decisão puramente política e totalmente retrógrada levou ao fim a operação desses veículos que tanto contribuíram no desenvolvimento da mobilidade urbana e na sustentabilidade.
Vida longa ao trólebus.